Ouvi falar de gente dizendo que se as dobras do hakama fossem invertidas, isso fugiria da tradição e não deveria ser usado. Eu não concordo. Não acho que o hakama que se veste influencie seu Aikido ou budo de forma alguma.
Hoje em dia, se você fosse convidado à Casa Branca para conhecer o presidente dos Estados Unidos, você poderia ir vestindo uma calça jeans, uma camiseta básica e chinelos. Provavelmente, você não se vestiria assim, mas poderia. Nos tempos feudais do Japão, se você fosse chamado por um daimyo(1) ou pelo shogun(2) e comparecesse vestindo roupas informais, você provavelmente seria decapitado devido ao desrespeito. Talvez, se você vestisse um hakama com dobras invertidas, você seria decapitado. Esse tipo de tradição também se estendeu ao Aikido, como a raiz do budo e, conseqüentemente, o Aikido remete a tradições surgidas no Japão feudal.
Entretanto, para nossa sorte, nós não vivemos no Japão feudal.
Quando se começou a praticar Aikdo, todos usavam doguis de Judô. Mas não o faziam por regra ou regulamento que obrigasse o uso de doguis de Judô – simplesmente não havia outro tipo de dogui a usar!
Hoje em dia, vemos pessoas vestindo doguis de lona (como o que a Bu Jin Design(3) vende), doguis de Karatê, e até pessoas usando doguis de Tae-Kwon-Do com golas V. Algumas vezes, iniciantes vestem apenas uma camiseta básica e calças de ginástica no início do treino, pois ainda não compraram seu dogui. Isso tudo é aceito. Se você vestir um hakama não tradicional, não parece que seu Aikido não será prejudicado.
Houve inovações no que vestimos para treinar Aikido. Hoje há vários aikidokas que vestem hakamas da Bu Jin Design com koshiitas “Aiki-Style”(4). Nos tempos do Japão feudal, as pessoas não se importavam em usar a koshiita firme e rígida, pois quem a usava naqueles tempos não faria rolamentos nem nada parecido. Quando se começou a treinar Jiujutsu, alguns chegaram a ferir as costas por causa da koshiita. Esse é um dos motivos pelos quais eu inventei a koshiita “Aiki-Style”. Acho que a comunidade do Aikido recebeu bem essa inovação.
Da mesma forma, podemos ignorar a genealogia do Aikido? Se pretendermos ser tradicionais, não deveríamos todos treinar sob um Shihan japonês? Essa tradição não implicaria que não se pode aprender o verdadeiro Aikido com pessoas que não conheceram O-Sensei? Não deveríamos dizer que, se não treinamos com O-Sensei em pessoa, não estamos aprendendo o verdadeiro Aikido? Eu não penso dessa forma.
E o lugar que chamamos de dojo? Na América, há muitos dojos localizados em armazéns reformados, shopping centers (5), e outros lugares do gênero. Nesta semana mesmo, podemos chamar de dojo o Centro Atlético DuFour (DuFour Athletic Center) aqui na Universidade Católica (Catholic University) com tatames emprestados. Se quiséssemos ser rigorosamente tradicionais, esses lugares não poderiam ser dojos.
Podemos dizer que tais lugares, não planejados desde as fundações para servir de espaço para prática do “caminho”, não poderiam ser chamados de dojo? Quantos dojos nos Estados Unidos foram construídos dessa forma? Quantos dojos foram abençoados por sacerdotes Shinoístas? Se esses processos não foram seguidos, podemos dizer que tais lugares não são mais dojos? Eu não penso dessa forma.
Tome as igrejas como exemplo. Esses locais de veneração não foram criados por Deus. Não, Deus não criou essas igrejas; pessoas criaram. As igrejas são místicas, pois as pessoas as fazem místicas. É a mesma coisa com um dojo. Não importa onde o dojo se encontra. Enquanto as pessoas treinando dentro do dojo mantiverem uma atitude mística, o lugar se torna místico.
Ao praticar em um armazém, uma garagem, um parque, um ginásio, é a nossa contribuição ao local que o transforma em um dojo. Nossa contribuição torna as coisas místicas.
"Katachi dewa naku, kimochi." Não é a forma, mas é o sentimento por trás. Se nós nos envolvêssemos apenas com a forma das coisas, não seríamos capazes de perceber os sentimentos dentro delas.